Era meio-dia quando Hélvio parou diante das ruínas do antigo Arquivo Central da Prefeitura. O prédio queimado em 1992 estava coberto de hera e silenciado pelo tempo. Nenhuma reforma. Nenhum vigilante. Apenas esquecimento ou assim diziam os registros oficiais.
Com a chave em mãos e os bolsos recheados de documentos reveladores, Hélvio empurrou o portão corroído. O cheiro de cinzas antigas ainda pairava no ar. Mas algo ali estava errado: marcas recentes de pegadas na poeira, restos de vela derretida e uma câmera de segurança desligada, mas ainda presa no alto de uma pilastra.
No fundo do prédio, entre estantes retorcidas pelo fogo, uma sala de concreto resistia intacta. A chave girou outra vez, como se sempre tivesse sido dela. Ao abrir, o detetive deu de cara com um cofre lacrado, uma máquina de escrever, e dezenas de fitas de rolo armazenadas com nomes já conhecidos: Agenor, Gadelha, Vidal e Hélvio.
Sim. O nome dele também estava lá.
Rebobinou uma das fitas. A voz era familiar. A de Agenor.
"Se ele chegou até aqui, é porque escolheu saber. E isso significa que está pronto para pagar o preço. Hélvio, isso não é só uma investigação. É a continuação de algo que você começou... sem lembrar."
As imagens de um menino, um incêndio, e um chapéu de feltro caído no chão começaram a vir à tona em sua mente. Era ele. Na infância. Naquela mesma noite de 1992.
O arquivo não havia sido incendiado por acaso. Fora para protegê-lo.
Na saída, uma nova carta o esperava no para-brisa do carro. Sem assinatura.
"Agora você tem a chave. A cidade precisa da porta aberta."
Ele acendeu um cigarro, respirou fundo e olhou para trás uma última vez.
Sabia que aquilo não era o fim. Era o começo.